Tinha os pés gelados. Mas não tanto quanto o coração. Já não se lembrava muito bem de como aquilo tinha acontecido. Já não chorava, não ria, não tinha grande desejo por nada.
Também a voz, porque é com ela que dizemos o que o coração quer, se tinha tornado gelada, grave, robótica.
A figura agora era franzina e pálida.
Há já algum tempo que estava naquela cama branca, alimentada a soro.
Sabia que tinha encenado a própria morte. Deitou-se num caixão e cortou os pulsos, mas mais do que tinha previsto. Só queria chamar a atenção, porque não aceitava não ser o centro das atenções e das preocupações. Salvou-se de ter morrido, mas não se salvou de outra morte bem mais dolorosa - o hospício. A loucura tomou conta dela, acabou por entrar em coma. Já nem sabia há quanto tempo vivia naquela mesma cama: podiam ser dias, semanas, meses, anos. Anos!? O que é que se tinha passado durante aquele tempo todo (que lhe parecia infinito) em que dormiu?
Friday, October 19
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